Direito de Manifestação

A Constituição prevê que o limite para a manifestação de pensamento é de não ameaçar a ordem. Porém, ela não estabelece o que seja a ordem, e delega a imposição desta à organização do Estado. Pressupõe-se que a estrutura legal que legitima o Estado sofra mudanças, de acordo com diversos fatores sociais, que são projetados nas instituições.
Assim, se o enfrentamento a uma ordem estabelecida, dentro do procedimento democrático, não é vedado pela Constituição, seria legítima a reivindicação do direito à manifestação de identidade ou à apologia às condutas ilegais, para conhecimento público, mesmo que o desfecho fosse a desaprovação dos manifestantes.
A intenção aqui não é de defender o crime ou enfrentar a ordem, mas enfatizar a importância do caráter democrático, que é muito claro dentro da Constituição, sobretudo, aplicar os princípios democráticos em temas polêmicos e controversos.
A descrença na capacidade de discernimento do povo pode alimentar o argumento de incitação a uma ilegalidade para as manifestações de afronta, o que funciona como uma forma de controle da organização (instituição) sobre os organizadores (o povo).
É observado que, quando as manifestações se chocam com pontos de vistas bem definidos da sociedade, são rapidamente proibidas, por força da legalidade, e sem questionamento da sociedade. Por exemplo, se a manifestação fosse de apologia ao uso de drogas, ao linchamento de criminosos, à homofobia, à xenofobia, ou ao racismo, seria prontamente proibida Nesses casos, somam-se a força da legalidade e o senso comum popular.
Porém, em temáticas mais polêmicas, ou de pontos de vistas muito divergentes, tais como a legalização do aborto e o aumento da pena para crimes hediondos, as manifestações não são proibidas, embora, do ponto de vista apenas legal, teriam de ser, pois são contra o modelo de pena para o réu e ignoram os direitos fundamentais do nascituro. Nesse caso, o senso comum popular, sobretudo influenciado pela comoção pela vítima, pode ir contra a ordem. Então, é notória a disparidade nas pressões que a sociedade civil exerce sobre o Estado e, conseqüentemente, há atendimento diferenciado da demanda por mudanças das leis.
Devido a essa complexidade, e ao embate constante entre ordem e povo, penso que é importante que se permita qualquer manifestação, vez que ela, em si, não atrapalha a ordem, apenas expõe os manifestantes ao juízo coletivo.
A proibição da livre manifestação sem fundamentos legais é inconstitucional. Se há fundamentos legais, pode se pensar que as manifestações devam ser julgadas politicamente antes de ir para a esfera legal, pois a Constituição prevê que a ordem seja construída pelo povo, e que seja garantido o direito de oposição.